A democracia no Brasil



    A trajetória política de nossa história é marcada por avanços e recuos com longos 
períodos de regimes autoritários e ditatoriais. O caminho de nosso desenvolvimento econômico e social com a inicial e marcante experiência da escravidão, a forma da colonização e exploração pela Metrópole, o tardio e lento desenvolvimento industrial nas primeiras décadas do século XX e as estruturas políticas herdadas dos períodos colonial e imperial, apresenta características que contribuíram significativamente para dificultar e consolidar a democracia no país. 




Vários autores mostraram como as democracias ocidentais que ganharam estabilidade e se consolidaram vejamos alguns exemplos:

1) Em 1835, Alexis de Tocqueville, pensador francês e analista da sociedade de seu tempo, em sua obra Da Democracia na América,  reconhece nos Estados Unidosda América a forma autêntica da democracia dos modernos contraposta à democracia  dos antigos .  No Prefácio da edição de 1848, escreveu: 

“Há sessenta anos o princípio da soberania do povo, que tínhamos introduzido ontem em nosso país, reina soberano na América, posto em prática do modo mais direto, mais ilimitado, mais absoluto. (...) Às vezes é o próprio povo que faz as leis, como em Atenas; às vezes são os deputados, eleitos por sufrágio universal, que o representam e agem em seu nome, sob a sua vigilância quase direta”.  Ao lado desse reconhecimento, Tocqueville previu as tensões políticas e as revoltas que resultariam da busca por igualdade por parte dos americanos descendentes de africanos.  

2) Norberto Bobbio comenta em um de seus livros: “mais que pela igualdade das condições, a sociedade americana impressionou Tocqueville pela tendência que têm os seus membros de se associarem entre si com o objetivo de promover o bem público”. Sobre isso Tocqueville escreveu: “Independentemente das associações permanentes, criadas pela lei sob o nome de comunas, cidades e condados, há uma multidão de outras, que devem o seu surgimento 
e o seu desenvolvimento tão somente a vontades individuais. (...) Nas democracias todos os cidadãos são independentes e ineficientes, quase nada podem sozinhos e nenhum dentre eles seria capaz de obrigar seus semelhantes a lhe emprestar  sua cooperação. Se não aprendem a se ajudar livremente, caem todos na impotência”.

3) Em 1787, Thomas Jefferson, um dos pais da democracia americana, escreveu: “Uma pequena rebelião de vez em quando é uma boa coisa” para a democracia, pois  ajuda o governo a ficar atento aos desejos dos cidadãos. (citado no livro Sociologia – Sua Bússola para um novo Mundo; p. 325) Esses protestos que mobilizam grupos sociais de forma mais ampla são característicos de movimentos sociais.São esforços coletivos para mudar aspectos importantes da ordem social ou política.Concluindo sobre o futuro da Democracia ( O Futuro da Democracia, editora Paz e Terra, 1986,  pp. 39-40), Bobbio resume o que considera essencial para nossa reflexão e pergunta:   

Como a democracia (que é predominantemente um conjunto de regras de procedimento) “pode pretender contar com cidadãos ativos? Para ter os cidadãos ativos será que não são necessários alguns ideais? É evidente que são necessários os ideais. Mas como não dar-se conta das grandes lutas  de ideias que produziram aquelas regras?”  Em seguida, Bobbio enumera  esses ideais:

 1º) “legado por séculos de cruéis guerras de religião, o ideal da tolerância. Se hoje existe uma ameaça à paz mundial, esta vem ainda uma vez do fanatismo, ou seja, da crença cega na própria verdade e na força capaz de impô-la. (...)  

2º) Temos o ideal da não violência.(...) As tão frequentemente ridicularizadas regras formais da democracia introduziram pela primeira vez na história as técnicas de convivência, destinadas a resolver os conflitos sociais sem o recurso à violência.  Apenas onde essas regras são respeitadas o adversário não é mais um inimigo  (que deve ser destruído), mas um opositor que amanhã poderá ocupar o nosso lugar. 
3º ) O ideal da renovação gradual da sociedade através do livre debate das ideias  e da mudança das mentalidades e do modo de viver: apenas a democracia  permite a formação e a expansão das revoluções silenciosas, como foi por exemplo  nestas últimas décadas a transformação das relações entre os sexos – que talvez  seja a maior revolução dos nossos tempos. Por fim, o ideal da irmandade  (a “fraternité” da revolução francesa). Grande parte da história humana é  uma história de lutas fratricidas. (...) Em nenhum país do mundo o método  democrático pode perdurar sem tornar-se um costume. Mas pode tornar-se  um costume sem o reconhecimento da irmandade que une todos os homens  num destino comum?”
Algumas perguntas para a reflexão e discussão:
1) Afinal, o que mantém a sociedade coesa? O que torna a ordem social  possível e duradoura mesmo em sociedades onde persistem significativas desigualdades sociais? O que caracteriza o estado social que consideramos  anárquico?Como podemos entender o crime como uma ameaça social? Se refletirmos sobre as situações cotidianas em que agimos com naturalidade  sem pensar que podemos correr riscos maiores em relação ao nosso bem-estar e  às nossas vidas, como podemos explicar essa confiança? E quando ela começa a falhar? 
2) Tocqueville foi um observador do mundo social e chegou às suas conclusões comparando as duas experiências que vivenciou, ambas inspiradas nos ideais democráticos. Uma dessas experiências foi a mudança provocada em seu país pela Revolução Francesa, que desembocou no período do Terror, e pela Revolução de 1848, que levou à instalação de um regime ditatorial. A segunda experiência de Tocqueville com as transformações sociais e 
políticas de seu tempo, foi a sua permanência de nove meses em viagem pelos Estados Unidos da América e que resultou no seu famoso livro Sobre a Democracia na América.
Essas experiências o levaram a fazer perguntas importantes até hoje consideradas pelos estudiosos da vida social e política, como por exemplo: como garantir o equilíbrio entre a igualdade e a liberdade em sociedades democráticas? O sufrágio universal e a escolha dos governantes pela maioria garantem a liberdade?
Essas questões colocadas por Tocqueville têm relação com o desafio da participação? É fácil garantir a liberdade de cada indivíduo? Como é possível?

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